Nasci numa pequena aldeia de Portugal.
Como qualquer criança frequentei a escola. Foi nessa altura que eu comecei a sofrer agressões físicas(hoje conhecido como bullying).
Não me vou alongar muito pois o sofrimento é mais forte.
Ia para a escola descalça e com roupas que me davam, pois os meus pais não tinham possibilidades, éramos pobres, o meu pai era alcoólico, minha mãe era analfabeta, éramos nove irmãos.
Tinha sete anos quando entrei para a escola, era boa aluna, o que fez com que algumas colegas tivessem inveja, queriam que eu fizesse mal os trabalhos escolares, sou teimosa por natureza e não fiz o que elas queriam ,a Paula tinha treze anos e a Anastácia tinha catorze anos, eu apenas sete ,foi aí que elas me começaram a agredir puxavam-me os cabelos ,empurravam-me contra outras colegas ,que me batiam dizendo que eu as tinha magoado, não me podia queixar a ninguém porque elas negavam (e como era claro é mais fácil acreditar em quatro ou cinco mentirosos do que num que diz a verdade)se me queixasse em casa o meu pai batia-me ,então sofria em silencio, passei de ano, as agressoras também passaram.
Nesse ano passei a ser a vitima perfeita para a professora descarregar toda a sua fúria, apelidou-me de pequenina, baixinha e anã, sofri em silencio pois não me deixavam falar, para me humilhar essa professora mandava as alunas da 4ªclasse baterem-me dentro da própria sala de aulas, se elas não o fizessem eram agredidas pela professora ,todos os dias eu era chamada ao quadro(era boa aluna ,mas tinha dificuldades na fala) havia sempre a mesma pergunta 9x8=72 eu respondia 62,então fazia-me bater com a cabeça no quadro várias vezes, de seguida dizia-me para eu escrever e eu chorando escrevia 72.nessa altura a professora obrigava todas as raparigas daquela sala a bater-me eram chapadas e pontapés ,chegaram partir-me a cabeça. Foi nessa altura que a única amiga que eu tinha se colocou frente á professora e ameaçou contar ao pai dela, (um senhor rico e poderoso)a Cristina disse-o e fê-lo ,não sei o que este senhor fez mas a professora foi substituída de imediato.
As agressões físicas deixaram de ser tão frequentes, mas começaram as psicológicas, como dizerem-me tu não tens dinheiro porque o teu pai é um bêbado, nunca vais ser nada na vida, não passas de uma anã, e se disseres alguma coisa partimos-te o focinho, ouviste cadela, foi assim até á 4ªclasse.
Nessa altura veio uma professora (a D.Antonieta) que se começou a preocupar comigo pois eu continuava a ser das melhores alunas na turma mas não brincava com ninguém,,passava os entreva-los sozinha e se alguém se aproximasse chorava com medo do que faziam.
Foi então que essa professora chamou todas as meninas para a sala de aulas, e lhes perguntou qual a razão de não brincarem comigo, as agressoras mentiram e disseram que eu é que não gostava delas e que não brincava porque tinha vergonha de ser anã.
A professora ralhou com essas meninas, e proibi-as de me chamarem anã; pois eu era apenas um pouco mais baixa do que elas.
No fim da aula esperaram-me e bateram-me de novo, e ainda me ameaçaram que se eu contasse á professora me matavam, que até as tripas me tiravam; a Ana Paula e a Anastácia eram as piores, mas incitavam outras a faze-lo.
Fiquei com muito medo e no dia seguinte não queria ir para a escola, dizia que estava doente doía-me a barriga; não apareci na escola mas a única amiga que eu tinha (a Cristina) contou á professora que as outras me tinham agredido, a professora chamou a guarda-fiscal para que me fossem buscar a casa acompanhados por uma auxiliar; fui obrigada a ir para a escola , Mas logo que entrei na sala e vi as agressoras desatei a chorar ,estava em pânico com medo do que elas me pudessem fazer ; a professora conseguiu acalmar-me.
Depois mandou a guarda-fiscal ir falar com os pais dessas meninas; elas deixaram de me bater mas humilhavam-me chamando-me nomes, como és filha dum bêbado, marreca, e outros nomes que nem se devem mencionar, era assim diariamente.
Recorda-me um dia em que a professora perguntou o que queríamos ser quando forem adultos? De imediato respondi que queria ser professora.
No fim dessa aula quase toda a turma se ria de mim; diziam achas que uma marreca pode ser professora e levas o bêbado do teu pai ou a palerma da tua mãe? Nesse dia mandaram outras meninas bater-me, eu não me podia defender porque elas não deixavam.
Só Deus sabe o sofrimento que eu tinha, mas a minha vontade não era bater-lhes era estudar para lhes provar que qualquer pessoa tem direito a escolher a profissão.
Mesmo depois já na juventude continuavam com os insultos; como não tinha com quem falar isolei-me em casa; não ia a festas nem outros divertimentos para não ser ofendida e humilhada. Foi assim até aos 20 anos.
Aí ganhei coragem e procurei novas amizades, através de correspondência; eu não imaginava que houvessem pessoas que me pudessem compreender; mas foi com essas amizades que eu consegui ultrapassar algumas crises da minha adolescência, pois a maioria das vezes a tentação era o suicídio, para mim a vida não tinha valor.
Mas as amizades que eu tive através de correspondência e com quem conseguia falar, deram-me o apoio moral de que eu precisava.
Hoje com quase 50 anos. Vivo longe dessa terra e não desejo voltar para lá porque as magoas ficam e ninguém as consegue apagar da minha memoria.
Já fiz tratamentos com psicólogos e ate com psiquiatras, mas isso apenas me ajudou a aprender a viver com estas mágoas; porque não há maneira de as apagar.
Naquela época chamavam-lhe agressões ou violência, hoje chamam-lhe bullying.
Quero também dizer que o bullying nem sempre é praticado em grupos e pode mudar até de agressores; para isso basta que se apercebam de que ninguém liga ou acredita na vítima, porque assim a vitima passa a ser vista como agressor.